quinta-feira, 3 de junho de 2010

Zara parte I

-Zarinha, olha, um disco voador!
-Não bobão, é um avião descendo em Viracopos.
- Tá, mas podia ser né?
Estavamos deitados sózinhos no quintal da tua casa.
Era enorme, parecia mais uma chácara, e estavamos sós.
- Tava aqui pensando...
- Não pensa não Dinho.
-Para sua idiota, só pensei uma coisa.
- Que coisa, alias é a pergunta q vc quer ouvir. Que coisa?
- Você acha mesmo que tudo vai ser como a vó Zara disse? Sobre nós?
- Vai amor. Vai.
- E ela não pode errar?
- Ela não erra.
- Mas não acredito em destino.
- Você nem bem acredita em Deus. Destino é a menor parte.
- Parte do que?
- Do que viveremos aqui.
- Zarinha, olha outro disco Voador!
- Avião Dinho.
- Sou meio bobo né?
- Completamente.
- Nosso aniversário está chegando...
- Temos um monte ainda. O q vc vai fazer? Vem aqui.
- Não, meu avião parou de funcionar. Não voa mais.
- Porque vc é burro e não trocou o botão de partida.
- Isso não tinha q ser. Me diz! Pq estou aqui?
- Pq vc me ama, pq eu te amo. Só isso.
- Zarinha vc é virgem né?
- Vc sabe q sim seu otário.
- Sei nada não. Nunca chequei.
Rimos.
Choramos fingindo q riamos.
- Zarinha
- oi
- Nem eu sabia a hora que nasci e ela sabia. O dia podia ter visto, mas a hora...?


- Você Dinho, nasceu em 20 de Julho, dia que nasceu Santos Dumont, dia q o homem pisou na Lua pela primeira vez. Vc nasceu em 1961 as 9 horas e tres minutos, em Campinas. Beneficiencia Portuguesa. E eu nasci no mesmo exato momento e no mesmo lugar. Isso são fatos.


- Quando ela me disse, sério, desconfiei. Cheguei prá minha mãe e perguntei: Que horas eu nasci? Ela respondeu, lá pelas nove da manhã. Minha cabeça deu um nó.
- imagino Dinho, é duro não existirem respostas né? Olha outro avião!
- Disco Voador.
- Bobo.


- Zarinha vc acha mesmo q tudo vai acabar como ela disse?
- Que nascemos no mesmo dia, hora e local e morreremos distantes no mesmo dia e hora?
- é.
- Tenho certeza.


- Bom, então faz um favor para mim?
- Faço. Qual?
- Se cuida. Quero ficar aqui muito tempo ainda.
E rimos...


Isso foi no final dos anos 70.
Foi minha grande amiga, foi minha luz, foi meu norte.
Eu comia "lavagem" no restaurante da Unicamp, erá péssimo. E ela me convidava para almoçar com a família, e eu muitas e muitas vezes fui.
Ela era moderninha. Linda demais. Espanhola de nascença.
Vc não percebia q era cigana a não ser pelos brincos.
Ela foi uma das mulheres mais lindas que conheci. 


A familia era doida. O pai muito sério, a mãe muito prestativa, mas a vó... Vó Zara.... era totalmente maluca.
Ela morava numa barraca no quintal de mais de Mil metros quadrados, pq não aceitava ficar em uma das 5 suites da casa.


Quando cheguei a primeira vez,
Zarinha cujo nome é o da avó: Zara. Me avisou:
- Escute mas entenda, ela tem mais de 80. Tá?
- Oi dona Zara!
- Dona Zara? Não sou dona de nada. Zara.
- Tá... Oi Zara.
- Que idade vc tem moleque?
- 17
- Mostra tuas mãos ai.
Estendi para ela.
Olhou olhou e olhou de novo.
Percebi uma coisa estranha.
Lágrimas em seus olhos.
Ela disse:
- Radan, vem aqui agora.


Não havia como se escutar, mas logo apareceu esse cara, irmão da Zarinha.
- Tudo bem vó?
- Tudo. Vc tá vendo a Zarinha e seu amigo ai?
- Quem é esse cara vó?
- Diferente de nós. Mas Radan, proteja-os. A vida deles está ligada. Um morre se o outro morrer.
- Tá vó mas não entendo..
- Não pedi para entender Radan. Proteja. Não pergunte o q não posso explicar.


(continua)

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